segunda-feira, 6 de julho de 2009

Corredor.

Desta vez não deu. Fui obrigado a sentar no corredor do ônibus até muito além de Serrinha, aquela cidade da vaquejada. Pois bem. Sem grilos nem medos de ‘mim’, olhemos pra dentro, pois.


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Na poltrona do outro lado do corredor, pouco a minha frente, estava aquele rapaz que não sei se chamo assim ou de senhor, já que ele possui idade para tanto. Ocorre que ele ostentava um visual de malhado de academia que lhe vestia de uma forma de aparentar severamente indefinida. A blusa branca colada no bíceps, marcas de acne na face, combinadas com um vozeirão à lá Francisco Alves, compunham um personagem insólito e complexo.


Quando começou a conversar com a cabeça que sobrava da poltrona em minha frente, fui impelido num golpe rápido da audição a prestar atenção. A cabeça aparentava ouvir sem muito entusiasmo, num quase silêncio. Como os músculos das nucas não se movem para formar expressões que nos auxiliam a interpretar certas reações, o interlocutor do senhor da academia permaneceu uma incógnita daquele meu ponto de vista. Ouvir, entretanto, é que foi bom.


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Minha ex-mulher. Uma ingrata, rapaz. [pausa] Ex-mulher, né não? Cê sabe como é. A menina tá se perdendo lá com ela. Oito anos, rapaz, precisa ver. Uma princesinha a menina. Agora ela fica levando a menina pra academia. Eu já disse a ela. Vou entrar lá e meter a porra nela e naquele escroto que ela tá se esfregando agora. Um monte de macho velho suando em cima da menina, rapaz? Se não tem com quem deixar, deixa com a minha mãe, né não? Com a vó, porra. Por ela não. Ela que fique lá se esfregando nos macho dela lá. Ali eu conheço. Agora botar a menina lá dentro? Né não? Eu vou no juiz. Vou. Né não? Tô me esfolando pra pagar a pensão da menina, rapaz. E ela lá... acha que dá exemplo. Isso lá é bom exemplo? Ela se acha a esperta. Ela fez faculdade, sabe? Pensava que eu era otário. Ela se fudeu comigo. Pensou que porque fez faculdade podia me fuder. Ela tira uma grana naquela academia e queria me esfolar na pensão, rapaz. E eu só posso ver a menina lá na academia. Se um peso daquele cai na cabeça da menina eu trucido aquela vaca.


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Vagabundo. Filho da puta atrasou a pensão de novo. [aumenta a velocidade da esteira] Eu que sou burra. Existe camisinha pra quê, idiota? Parecia uma adolescente com aquele troglodita. Mas Mimi não tem culpa do pai que tem. Coitada de Mimi. Quanto mais longe ele estiver dela melhor. Ainda bem que ele caga de medo de Wando e quase não vem aqui. Nunca mais transo na esteira da academia.


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Minha mãe... Luiza da quarta série riu do meu sapato hoje na frente das meninas e elas riram muito de mim. Estava todo arranhado, minha mãe. EU – QUERO – OUTRO. Agora! Foi Janaína, aquela burra que arranhou meu sapato. Não sabe lavar nada. Bota ela pra fora! Agora!


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Eu quero é voltar pra Juazeiro.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. é um fragmento de um quadro dele. o crédito está ali do lado (abaixo do objeto impossível).

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